Nos anos 60, eu li em algum lugar que o corpo fala, que memorizei como sendo um livro de Rollo May e descubro, ao pesquisar para escrever esta crônica, que a nossa mente nos engana. O livro, lançado em 1980, obteve enorme sucesso e inúmeras reedições, é do Psicólogo Pierre Weil e Roland Tompakow.
A gente era mais simples, apenas corpo e alma. Depois veio a mente e sua divisão. Passamos a saber que temos também um subconsciente, graças a Freud e Jung.
A vida era mais simples e o médico de família ou o farmacêutico batia o olho e dizia o que estávamos sofrendo. Agora, existe especialista em mão, fundo do olho e não sei o que mais.
Deixo as divagações e volto para o meu corpo. Ele vinha mandando recados, sob a forma de cansaços, de sono e pequenas dores. Eu seguia num ritmo frenético de diretor do Sindifisco Nacional, terminando o dia com tarefas pendentes, de voluntário para a elevação de escolaridade, de promotor da poesia, da cultura da paz, colaborador do Jornal Daqui.
Até que ele disse: para! Eu só consegui dirigir até o Café da Terra, na volta para BH. No dia seguinte, precisei de ajuda para levantar da cama e fomos para o hospital da Unimed, superlotado, para um dia inteiro de espera, exame, espera e nada de resposta.
Após as 18h da segunda feira, ainda faltava uma ressonância magnética, que dificilmente seria feita neste dia, mas, se eu saísse de lá, teria que reiniciar a via crucis. Fui para o centro de enfermagem, apinhado de gente, passar uma “longa jornada noite a dentro” numa poltrona reclinável.
Registro que, de todos os médicos e médicas, apenas um jovem foi frio, insensível e não atencioso, e parabenizo os demais pelos esforços em amenizar os problemas dos pacientes.
A última orientação foi que eu esperasse, pois me chamariam para o exame. Daí a pouco, iniciaram um soro na veia.
Neste cenário estranho, onde deveria reinar o silêncio, criei mentalmente uma longa peça teatral de moderado terror, tendo ao centro uma senhora bem vestida, com três voltas de pérola no pescoço e que, desde a triagem, manifestava em alta voz, sua revolta: “Eu tô com fome! ...Vou fazer um BO e mandar prender vocês todos!...Quero mijar!...
E eu ficaria esperando até o fim dos tempos, se não fosse a Dodora ir perguntar. Daí fomos encaminhados para o exame, depois informados que ele não poderia ser realizado, algum tempo depois encaminhados para uma consulta e escolhermos fazer o exame fora.
Saí com uma receita pesada e o diagnóstico de que estava com pneumonia e covid, o que seria quase uma sentença de morte há algum tempo atrás.
Eu não sentia nada, a não ser uma dor forte na região da cintura, que dificultava meus movimentos. Neste momento, passei sete dias sonolento e tenho a oportunidade de usar a resposta fantástica do Chico Anísio ao Jô Soares:
“Medo de morrer? Não. O que eu tenho é pena...”